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“Quanto a mim, nunca pude sequer ver perseguirem e matarem um inocente animal, sem defesa, e do qual nada temos a recear, como é o caso da caça ao veado, o qual, quando sem fôlego e sem forças, e sem mais possibilidade de fuga, se rende e como que implora o nosso perdão com lágrimas nos olhos: “gemendo, ensanguentado, pede misericórdia” [Virgílio]. Um tal espectáculo sempre me pareceu muito desagradável.
Se apanho algum animal vivo, dou-lhe liberdade. O mesmo fazia Pitágoras que comprava peixes e pássaros para os soltar: “Foi, creio, como o sangue dos animais que o ferro se tingiu pela primeira vez” [Ovídio]. Os que são sanguinários com os bichos, revelam uma natureza propensa à crueldade. Quando se acostumaram em Roma com os espectáculos de matanças de animais, passaram aos homens e aos gladiadores.”
- Michel de Montaigne, Ensaios, Livro segundo, Capítulo XI, "Da crueldade"
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